quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Resenha - As crônicas de Nárnia (parte II)

LEWIS, C. S. Prince Caspian. The Chronicles of Narnia. New York: Harper Collins, 2002.
__________. The Voyage of the Dawn Treader. The Chronicles of Narnia. New York: Harper Collins, 2002.


Meus caros, eu ia fazer uma única resenha abarcando todos os livros que faltavam, mas não teve jeito. Cada um mais recheado de coisa que o outro, acabou que vou fazer mais duas resenhas. Nesta aqui falaremos dos 4º e 5º livros da série, deixando os outros dois pra próxima. Seguindo a mesma metodologia da resenha anterior, vamo simbora.


Príncipe Caspian



Destacando apenas as coisas que achei interessante. Neste livro vi a primeira referência ao pai das crianças, embora sem nome ainda. A gente vê que o foco do livro é realmente infantil. Aliás, talvez por isso, me parece que Lewis tem um apreço especial por pequenos animais da floresta. O Castor já teve participação importante antes, e aqui temos também o Texugo em relevância.

Falando de criaturas, a maturidade e nobreza de algumas delas (o que representa bem o espírito do perfeito gentleman inglês) não deixa de me surpreender. Em determinado momento, um conselheiro que era contra algumas ideias do Príncipe Caspian, teve o bom senso em dizer: "You are my King. I know the difference between giving advice and taking orders. You've had my advice, and now it's the time for orders." (p. 102)

Lewis tem um invejável conhecimento de estratégias de guerra, geografia, táticas, entre outros. Reflexos de uma outra época, uma outra geração e, claro, dos seus próprios estudos na área da literatura. Aliás, ele não tem medo de fazer uso da violência, mesmo que não seja explícita. Talvez reflexos de outra época? Tem cabeças degoladas e gente morta no livro infantil, tudo de boas.

Também influenciado pelo background de professor de literatura (imagino eu), Lewis teve uma sacada legal: ele coloca deuses da mitologia grega no livro (Baco está lá), mas todas estas entidades mágicas submetem-se a Aslan. Aliás, em paralelo, não em recordo de um mundo de fantasia onde os Anões são arqueiros -- algo que ocorre em Nárnia.

Por fim, tem muita coisa que a gente, por não ter conhecimento suficiente, ouve de outras pessoas e toma como verdade. Há um tempo, um revisor pegou um texto meu (na verdade, mais de um) e viram que eu usara letras maiúsculas pra indicar grito ou intensidade na voz (TIPO ISSO AQUI!). Ambos disseram que isso não era de bom tom, não ficava adequado, que era linguagem de internet, etc. 

Pois bem. Aqui estou eu com um livro de 1951, com a seguinte citação: "Conduct His Royal Highness to his apartments and send His Royal Highness's nurse to me AT ONCE." (p. 44). Ora, se Lewis pode usar e não fica ruim, por que eu não posso?


A Viagem do Peregrino da Alvorada


Bom, este livro é bem diferente dos outros da série. Pela disposição do texto e a forma como a narrativa é contada, torna-se quase um livro de contos, vinculados a um enredo simples da própria voyage. Ah, só pra que conste, "Peregrino da Alvorada" é o nome do barco, que carrega toda a jornada.

Algo interessante, é que, pelo menos no começo, Eustace é chato e ridículo, mas considerando como ele foi levado a Nárnia de forma tão súbita, foi a reação mais verossímil que já vi na série até agora. Afinal, quem é arrancado de seu mundo e transportado pra outra realidade dificilmente terá uma reação que não se aproxime da loucura.

Lewis consegue em dois parágrafos fazer uma excelente recapitulação das aventuras anteriores. Aliás, o fato de ele linkar diretamente os fatos entre uma aventura e outra, realmente dá a impressão de que tudo é uma história só, ainda que os livros funcionem de maneira praticamente independente (com isto quero dizer que, pelo menos até agora, não há cliffhangers que remetam necessariamente a uma continuação).

A descrição do navio, para meus olhos contemporâneos, não era necessária. Mas, para os olhos infantis de crianças de meados do século passado -- para quem, diga-se de passagem, andar em navios era uma senhora aventura, quanto mais navios de batalha --, era de encher os olhos poder imaginar e se sentir dentro de tudo aquilo.

De modo geral, as descrições de Lewis são boas, mas voltadas para um público infantil (o que fica evidente com as referências que ele faz). Tem algumas, porém, que se destacam. Ele descreve uma cena e a resume com maestria da seguinte forma: "A powerful dragon crying its eyes out under the moon in a deserted valley is a sight and a sound hardly to be imagined." (p.98).

Algumas coisas bem bonitas ficam registradas. Por exemplo, não é de hoje que a amizade pode salvar vidas: "The pleasure (quite new to him) of being liked and, still more, of liking other people, was what kept Eustace from despair." (p. 108).

A cena de Eustace e Aslan. Ah... que linda alegoria sobre o pecado. Bom, de modo geral, Aslan é que realmente é o grande personagem das histórias -- embora eu acredite que muitos críticos o aproximariam de uma solução Deus ex machina pra alguns pontos da história (e eles não estariam errados). Lewis, não obstante, é muito bom em descrever algumas características de Aslan sem dizê-las diretamente. Por exemplo, neste trecho ele aponta para sua eternidade:
"[...] Do not look so sad. We shall meet soon again."
"Please, Aslan," said Lucy, "what do you call soon"?
"I call all times soon," said Aslan; [...]" (p. 174)
Sobre essa questão de encontros com Aslan (que é o clímax no final, de certeza), Caspian faz uma excelente pergunta: por que o pessoal da Terra vai a Nárnia, mas o inverso não acontece? Hum... Tá certo que a resposta é porque o autor não queria bagunçar a história rsrsrs, mas é uma boa. Porém, só pra lembrar: no primeiro livro (O sobrinho do mago) tem personagens que vão pra Terra também.

Perto do final achei meio anticlimático, parece que o autor estava com vontade de acabar logo e partes que mereciam profundidade foram resumidas em poucas linhas. Isto é... até a parte em que verdadeiramente lemos o final... Meu Deus... O primeiro livro da série pode ser meu favorito, mas... esta passagem... não tem nada, nada, nada em qualquer outra parte dos livros, que se compare a esta conversa entre Aslan e Lucy. Que fique a curiosidade no ar. Eu sei o que significa.

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Em breve entrego a resenha dos dois últimos livros da série. Mas já estou com tristeza antecipada: eu sei que vai acabar, haha. No meio tempo, leiam Personagens não bíblicos e suas histórias!

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