sábado, 11 de maio de 2024

Resenha — O segredo do best-seller

ARCHER, Jodie; JOCKERS, Matthew L. O segredo do best-seller. Bauru: Alto Astral, 2017.


Comprei o livro já pensando que seria ruim. Afinal, não tem como um título desse estar certo, né? Mas devo confessar que o livro foi surpreendentemente útil. É que os autores não estão querendo vender uma ideia, eles estão só apresentando resultados de uma pesquisa de doutorado.

Os autores criaram um modelo compuacional para analisar os best-sellers da lista do The New York Times e, a partir da análise, tirar conclusões e tentar responder à pergunta: "O que faz de um best-seller... um best-seller?"

Como esse livro é praticamente acadêmico, não vou fazer uma resenha completa, mas vou destacar aqui os tópicos que achei essenciais:

#Cap. 1
  • O best-seller não é escolhido pela crítica, mas pelo público. Sucesso de vendas.
  • O sucesso não é aleatório, há um conjunto de características que os tornam best-sellers
#Cap. 2 – Tópico
  • Não há um tópico de sucesso maior, o que há é maior foco
    • Todos os best-sellers tem um único tópico componto 30% do livro
    • Os outros 70% ficam divididos entre outros 2 ou no máximo 3 tópicos
      • Esses outros tópicos necessariamente dialogam com o primeiro e o reforçam
      • Escritores não-best-sellers colocam 6 tópicos ou mais nos seus livros
  • Análise dos autores
    • Tópicos mais presentes em best-sellers: casamento, morte, impostos, tecnologia, enterros, armas, médicos, trabalho, escolas, presidentes, jornais, crianças, mães, imprensa. Mercado financeiro, laboratório, espiritualidade (mas não igreja), faculdades, cachorro. Pessoas reais.
    • Tópicos que quase nunca se tornam best-sellers: sexo, drogas, descrições de corpo que não seja em contexto de dor ou crime, cigarros, álcool, deuses, emoções exageradas, revoluções, negociatas, viagens existenciais/filosóficas, jogos de cartas, danças, jantares.
    • O local preferido é a cidade, de preferência casas comuns.
      • Lugares que não emplacam: deserto, mar, floresta, rancho
#Cap. 3 – Trama
  • Os best-sellers tem reviravoltas constantes e um ritmo acelerado de trama
    • Na minha contagem, os best-sellers tem pelo menos 8-9 grandes reviravoltas
    • E todas elas com espaçamento mais ou menos igual
  • As tramas seguem o básico de preparação, confronto, resolução
  • 7 linhas narrativas principais, cada uma com um gráfico que aponta o tipo de história
  • As tramas sempre se relacionam com o leitor fisicamente ou emocionalmente
    • Não apenas intelectualmente
    • Muitos críticos dizem que best-sellers não são bons porque estão acostumados a uma experiência intelectual com livros, não emocional ou física
#Cap. 4 – Estilo
  • Estilo é o DNA do escritor (não tem como mudar, individualidade do autor)
    • Se traduz em hábitos (uso de expressões, substantivos, pronomes, etc.)
  • Característica do estilos estilos mais presentes em best-sellers
    • MAIS IMPORTANTE é o uso da "linguagem diária do homem comum"
    • A voz do narrador sempre parece de uma pessoa real
    • Uso de contrações é bem forte (n't ou -d)
    • Pontos de interrogação são bem mais preferíveis a pontos de exclamação
    • Reticências são bem-vindas
    • Frases curtas, sem palavras desnecessárias
  • Estilo que permita a compreensão do público
#Cap. 5 – Personagens
  • Bons personagens são ativos, sempre estão fazendo alguma coisa
    • É isso que leva a trama pra frente e faz a gente se envolver com eles
    • Personagens estão ligados a verbos (especialmente os que tenham a ver com estados mentais ou emocionais
      • "Precisar" e "querer" são os dois principais
      • "Sentir", "amar", "fazer", "pensar", "perguntar", "olhar", "segurar", "contar", "gostar", "ver", "saber", "começar", "trabalhar", entre outros
    • Por contraste, personagens ruins são muito passivos
      • Geralmente acompanhados de verbos como "parar", "largar", "parecer", "esperar", "interromper", "hesitar", "murmurar", "protestar", "perder", entre outros
#Conclusão

O livro é sensacional por sua abordagem. Foram mais de 2500 livros analisados, compreendendo os últimos 30 anos da lista de best-sellers do The New York Times. No fim do livro, os autores explicam com mais detalhes qual foi a metodologia de pesquisa deles e não temos escolha senão ficarmos admirados com o trabalho que isso deve ter dado.

Vou deixar o livro na estante, porque no futuro quero consultar de novo essa lista de verbos e substantivos. Não garanto que um dia terei um best-seller, mas não vejo motivo pra não me esforçar em consegui-lo. 

quinta-feira, 9 de maio de 2024

Resenha — Vidas secas

RAMOS, Graciliano. Vidas secas. Jandira: Principis, 2024.


Sei nem por onde começar. É que tenho algumas opiniões bem formadas sobre a obra e ainda não entendi como organizar os pensamentos direitos. Vamos ver o que sai.

Vidas secas é um marco da literatura brasileira e quando o vi por R$10 eu sabia que deveria comprar. Ainda não tinha lido Graciliano Ramos e precisava desse nome no meu currículo de leitor. Eu queria realmente aprender um pouco mais e conhecer melhor o cara.

Neste livro, estamos diante de uma obra em que fica bem evidente o espírito modernista. O livro é facilmente comparado a Macunaíma de Mário de Andrade. Não só o uso de regionalismos ou termos próprios a uma etnia, mas especialmente a narrativa não-linear e cheia de rododendros que parece refletir a mente do personagem e das situações que ele enfrenta. 

Até as repetições por parte dos personagens, o jeito que eles se comportam refletindo de modo muito forte a caboquice, o jeito bruto e até mesmo obtuso do estereótipo sertanejo, está tudo aqui. 

Assim, eu compreendo as escolhas do autor, o estilo... mas não gosto. Já vou dar o teor da minha resenha logo de cara aqui: Vidas secas é um excelente livro para estudo da literatura, mas não para se divertir com a literatura. Pra mim ele está muito próximo de A moreninha neste sentido.

O livro tem um quê de romance, mas a organização da história e a divisão me faz pensar que este livro está mais próximo de uma antologia de contos. Embora no primeiro capítulo tenhamos de fato uma apresentação da temática e dos personagens (coisa que vemos repetida no último), no meio o que temos de fato é uma coletânea de causos e estudos de personagem.

(Aliás, que primeiro capítulo! Nosso coração vai lá em baixo e sobe de novo. Graciliano realmente nos conquista, nós torcemos para o Fabiano, para sinha Vitória, pela Baleia... ficamos com medo da seca, torcemos pela sobrevivência dos nossos heróis... talvez o erro de Graciliano foi ter gastado muita munição nessa abertura, e o resto sofre um pouco em comparação).
Comparando-se aos tipos da cidade, Fabiano reconhecia-se inferior. Por isso desconfiava que os outros mangavam dele. Faziam-se carrancudo e evitava conversas. [...] Todos lhe davam prejuízo." (p. 58)
Certamente estamos diante de uma obra realista, não há dúvidas. Aqui o autor faz questão de mostrar o sertão nordestino tal como ele é. Com direito a sertanejos fugindo da seca e urubus rondando eles nos céus, só esperando eles definharem e morrerem. 

Agora, falando de personagens, de longe e sem medo de errar, a personagem mais interessante é a cachorra Baleia, porque ela simplesmente vive. Nós conhecemos as suas vontades, os seus desejos, e até nos identificamos com eles. Ela é simples. É uma personagem na qual o autor não sente a necessidade de incluir algum regionalismo ponto ela foge da premissa de usar nomes ou expressões regionais que tornam a narrativa cheia de lombadas.

Isso é um problema que vejo nos capítulos que funcionam como estudo de personagem. A necessidade da regionalização sem apresentação dela ao leitor, torna o texto desnecessariamente truncado. Me parece que o objetivo do autor não é deveras envolver o leitor, senão fazer uso de uma terminologia pouco explorada na literatura e dizer "Olha como seu diferentão". O que, se pararmos pra pensar, é bem o espírito do modernismo mesmo.

Some-se a isso que o livro quase não tem diálogos, isso torna a narrativa pesada. Não temos a oportunidade de desvendar os personagens por nós mesmos. Quando muito, conhecemos sua psiquê, mas sempre de fora. Além disso, somos sempre apresentados a uma sucessão de narrativas e descrições que englobam cenas e diálogos inteiros que poderiam ter sido explorados para dar lugar aos próprios personagens. 
Se pudesse economizar durante alguns meses, levantaria a cabeça. Forjara planos. Tolice, quem é do chão não se trepa. (p. 70)
Sei que deveria elogiar o livro por ser um marco da literatura brasileira. Mas a verdade é que ele é só muito chato. E não creio que a premissa do livro fosse ser legal mesmo, acho que ele foi feito para ser um estudo de literatura. Não nego a originalidade disso, mas pra mim o real valor está na exploração acadêmica do assunto, não no conteúdo em si.
(embora o capítulo sobre a cachorra Baleia me faça reconsiderar essa posição — não sei, quem sabe no futuro reconsidere tudo).

Enfim, concluo dizendo que está no meu currículo de leitor, mas não ficará na minha estante.

domingo, 5 de maio de 2024

Resenha — Corra, Alex Cross

PATTERSON, James. Corra, Alex Cross. São Paulo: Arqueiro, 2014.


Comprei num sebo por R$10. Na contracapa há uns dizeres característicos do marketink: "As páginas viram sozinhas!". Eu li isso e torci o nariz. Besteira. Aí eu li o livro. E descobri que era verdade.

Não conhecia a obra extensa de James Patterson, tampouco que Alex Cross é um personagem recorrente e tem uma série de livros só sobre suas histórias. Nem por isso aproveitei menos o livro. Aqui acompanhamos a história de Alex Cross, um policial de Washington, que tem três serial killers atuando ao mesmo tempo e agora tem que resolver os casos enquanto lida com questões familiares.

A estrutura do livro me pegou um pouco de surpresa. O autor optou por fazer de cada cena um capítulo. Isso nos traz capítulos de 1 página, às vezes. Por um lado entendo que isso torna o livro mais dinâmico, o que corrobora com a premissa de alguém sendo perseguido. 

Por outro, é como assistir um filme com muitos cortes de cena. Quando a gente começa a se ambientar, PAM, já estamos em outro lugar e fazendo outra coisa. Deixa o ritmo meio prejudicado. 

Do meio pro fim, porém, preciso confessar que isso já não me incomodava mais. Pelo contrário, me forçava a seguir em frente, sempre pensando "Ah, mas é só mais um capítulo". O miserável é um gênio.

Essa estrutura reflete bem a narrativa, que vai se afunilando e ficando cada vez mais frenética. A primeira impressão que tive não foi das melhores, achei o começo do livro meio confuso. O autor apresenta muitos personagens e a gente não sabe em quem investir nossa atenção, mas logo a gente se familiariza com quem é mais relevante e a história caminha bem.

Há algo a ser comentado, porém. É normal os autores acelerarem o ritmo no fim do livro, mas há uma linha tênue entre um ritmo frenético e uma narrativa corrida demais. Acho que o autor oscilou entre essas duas e houve trechos que, a meu ver, poderiam ter sido explorados mais e não sido resolvidos tão rápido. O clímax ficou meio apagado por causa disso.
Mas, algumas vezes, a vida é um ciclo, não é? Aquilo que você pensa que foi resolvido pode voltar até estar bem ali diante de você. (p. 215)
Esse livro é de 2013, publicado no Brasil em 2014 e consegui notar nele já um aspecto da mudança do nosso Zeitgeist. Acontece que só no capítulo 74 o autor menciona que o personagem principal é negro. Sensacional. A história é sobre pessoas, não sobre raças. Saudade dessa época.

Eu não categorizaria o livro como uma literatura adulta, mas também não o chamaria de juvenil. Há cenas um pouco pesadas e insinuações meio complicadas para um leitor mais novo. De qualquer forma, o autor sabe dosar as coisas e vê-se a maturidade que ele tem na sua escrita.

Enfim. Eu curti.