quarta-feira, 25 de março de 2020

Resenha - Barrabás

BEKESSY, Emery. Barrabás: o homem que foi trocado por Jesus. Rio de Janeiro: Central Gospel, 2006.



Encontrei esta pérola em uma das estantes do Shopping da Bíblia, em Manaus. E isto me levou a pensar quantos livros bons não estão por aí esquecidos nas estantes. Livros que têm alguma coisa a passar, mas que não chegam nas mãos dos leitores. Será que um dia este será o destino do meu? (Quer dizer! Isto se ele tiver alguma coisa a passar, né?). Mas divago.

De qualquer forma, antes de eu começar a falar desse livro que -- de antemão já afirmo -- é maravilhoso, preciso dedicar algumas linhas pra falar do autor. Isto pelo simples fato de que eu não consigo descobrir quem é esse cara! Pense num cidadão com informações difíceis de encontrar. A biografia na orelha do livro se limita a dizer que era um húngaro que emigrou para os EUA. Mas... que mais?

A verdade é que não há muita informação além disso. Encontrei na Wikipédia uma página sobre um Imre Békessy, que parece ser um personagem da mesma época do autor deste livro -- uma vez que o livro foi lançado em inglês no ano de 1946 --, mas não há referência à migração para os EUA e tampouco a autoria de um livro sobre Barrabás. 

Por outro lado, há um comentário bem mordaz numa revista... de 1947! Quando li o comentário achei um pouco exagerado, mas aí entendi a época. Pense bem, a Segunda Guerra tinha acabado de terminar. Logo, num livro onde judeus (fariseus, principalmente) são mostrados como cheios de ódio pelo Messias, fica fácil para os críticos o colocarem na categoria "anti-Semita".

Mas o livro está beeeem longe disso. Aquela era uma leitura da sua época. Hoje, não se tem como negar o ódio que os fariseus e a multidão tinham de Jesus. Não é de hoje que se sabe da crueldade que tiveram com ele. Tampouco é segredo que os fariseus e sacerdotes tinham controle político naquela época e temiam perdê-lo. Ou seja, havia muita política e politicagem envolvidas sim.

Bom, e já que estamos falando de coisas ruins do livro, eu vi alguns sérios problemas com a edição em português -- pelo menos essa à qual tive acesso. Há muitas falhas na digitação. Não é que se encontre várias; mas quando eu pego um livro publicado assim, espero encontrar zero falhas. Assim, encontrar mais de 10 é um bocado sim.

Por outro lado, também vejo problemas na técnica do autor. Há um exagero grande nos advérbios de modo, beira o limite da irritação. E falando em irritação, no começo do livro o autor tinha a mania de iniciar os capítulos com descrições geográficas que, até onde eu pude ver, foram totalmente irrelevantes para a história. Ah, mas está aí uma questão.

Como eu também escrevi ficção história (até certo ponto), e como já comentei isto em outra resenha, há um grande perigo nesse tipo de escrita: o autor acaba se deixando levar pela informação e imprime no texto uma qualidade não só literária, mas também pedagógica. Em outras palavras: depois de ler tanto sobre o assunto, o autor acaba querendo ensinar aquilo que aprendeu, em vez de só destacar o que é diretamente relevante para a história.

Porém, porém, porém. Apesar de tudo isso, eu vi neste livro aquilo que eu considero a marca de uma boa história: imersão. Em determinado momento da leitura, eu já estava mergulhado na história, cogitando o que fariam os personagens e como os eventos de desenrolariam. 

Enquanto no começo do livro a história se desenrola com passos tímidos, a partir do momento que Barrabás é preso, tudo fica ainda mais interessante. Ele se torna um personagem mais humano e admiração de Esdras (seu companheiro de luta revolucionária) concede mais densidade à história. Ah, sim, talvez fosse bom dar um panorama dos personagens.

Além de Barrabás, que carrega o título do livro, a história inicia-se (e termina de certa forma) com Esdras, um companheiro de luta de Barrabás. Este, por sua vez, era um ladrão e assassino que começou a ter pensamentos ultranacionalistas, pregando e tentando uma possível subversão armada contra o domínio romano -- a quem ele muito odiava. 

O tema "ódio" tem bastante relevância no livro, conforme é contrastado com o "amor", pregado pelo Profeta de Nazaré. E o ódio de Barrabás é até justificável aos olhos humanos. Como o livro retrata bem, para os romanos, a vida era só mais uma commodity. Se não fosse cidadão romano, então era descartável. Isto fica claro não apenas pelos tratamentos cruéis, mas até pelas falas. 

Voltando aos personagens, temos ainda José de Arimateia (que tem papel bem central na história), Lázaro e suas irmãs Marta e Maria, além de um personagem que está sempre presente mas se torna o centro da narrativa já mais perto do final: Pôncio Pilatos. Além disso, há alguns secundários como Cláudia, a esposa de Pôncio e o cego Eleazar, que ajudou Barrabás no começo.

Mas, meus amigos, não jeito. É impossível você fazer uma história ambientada no Novo Testamento e ter outro personagem principal. O título do livro é "Barrabás", mas logo fica evidente quem é o grande Personagem. Conforme a gente vai chegando no clímax, nosso pensamento não consegue deixar Ele de lado, ainda que vendo os fatos pelos olhos de outra pessoa.

E falando em clímax, os acontecimentos em torno daquele dia fatídico são tão cheios de significado (a multidão, a decisão jurídica, a morte, o véu do templo, os terremotos, a reação das pessoas) que é praticamente impossível falar deles sem que estejam repletos de símbolos que apontam para o Messias. 

No final, ficamos abismados como um livro escrito em 1946 consegue captar tão bem a essência daquela época, ou melhor, daquela história. Mas logo voltamos à razão e fica claro o motivo: porque a história de Jesus não se limita a uma época. É uma história que tem marcado e ainda marcará muitas gerações por vir. 

Sinto muito, Barrabás. Este livro vale a pena ser lido sim. Mas não por causa de você; mas porque é um livro que aponta para Jesus.

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