sábado, 29 de setembro de 2018

Resenha - A jornada do escritor II

VOGLER, Christopher. A jornada do escritor: estruturas míticas para escritores. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.


Vamos direto ao ponto e dar continuidade à exposição dos principais arquétipos em histórias, tal como apresentados por Vogler. São eles: Mentor, Guardião do Limiar, Arauto, Camaleão, Sombra e Pícaro. Lembrando que esses não são personagens fixos, mas máscaras que diferentes atores podem usar em diferentes momentos da história, pra trazer fluidez à trama.

#Mentor
  • Chamados por Campbell como "Velho(a) Sábio(a)", o Mentor geralmente é uma figura positiva que ajuda ou treina o Herói para que ele possa prosseguir a jornada
    • Em termos da anatomia da psique, o Mentor é o self, o aspecto ligado a todas as coisas
    • São representações elevadas de aspirações dos Heróis → algo que eles podem se tornar caso persistam na sua jornada
      • Muitas vezes o Mentor foi um Herói que completou sua jornada e agora passa seus conhecimentos a um jovem Herói
  • Funções do Mentor
    • Ensinar (ou treinar) → é a função-chave dele
    • Dar presentes → ele doa algo que o Herói precisa para seguir em frente
      • A regra de ouro é que os presentes devem ser merecidos. O Mentor não simplesmente dá por dar
      • O presente não precisa ser um objeto
    • Consciência → o Mentor pode ser uma consciência externa do Herói, alertando para questões morais ou escolhas
    • Motivação → algumas vezes o herói não consegue vencer o medo sozinho, precisa de um empurrão para seguir em frente
    • Plantar 
      • Esse é interessante e muito usado em filmes
      • O Mentor planta uma informação que vai ser necessária bem na hora H do filme
      • Pode ser um objeto também que salva o Herói ou algo assim
  • Tipos de Mentor
    • Mentor escuro 
      • É um arquétipo para desorientar o público
      • Em filmes de terror, é a isca que atrai o Herói para o perigo
    • Mentor caído
      • Um Herói que não conseguiu trilhar sua jornada com sucesso
      • Muitas vezes a plateia fica em dúvida se esse Mentor vai conseguir ajudar mesmo
    • Mentor continuado → são aqueles que dão várias missões (por exemplo), para quem o Herói sempre volta para dar continuidade à jornada
    • Mentores múltiplos
      • Variedade de mentores que ensinam habilidades específicas (Hércules é o melhor exemplo)
      • Essa multiplicidade serve para exprimir diferentes funções do arquétipo
    • Mentor cômico 
      • Aparece muito em comédias românticas → aconselha sobre o amor
      • Geralmente os conselhos levam à alguma situação inusitada, mas que depois dá certo
    • Mentor xamã → serve como porta de passagem para que o Herói alcance o Mundo Especial
    • Mentor interno
      • Muito comum em literatura noir → é um arquétipo interno do Herói
      • É como se o Herói já fosse calejado e tira as lições de si mesmo → mas também pode ser um livro ou objeto que carregue consigo e sirva de Mentor
  • Vogler ressalta que o Mentor não é um tipo rígido
    • Embora Campbell chame de "Velho(a) Sábio(a)", o Mentor não precisa ser Velho, nem Sábio
      • Pode ser um jovem que ensina uma lição a um mais velho
      • Pode ser um personagem qualquer que, numa ação específica, possa inadvertidamente ensinar algo ao Herói
    • Justamente por isso, não necessariamente o Mentor virá no começo
      • Ele pode ser necessário em qualquer ponto da história
#Guardião do Limiar
  • A passagem entre os limiares não é feita facilmente → há ali um guardião para impedir
    • Estes não são os grandes vilões → o mais comum é que tenham relação com o vilão
    • Mas podem ser figuras neutras → mecanismos para compor a paisagem do Mundo Especial
  • Podem ser neuroses, problemas comuns que nós enfrentamos
    • No nível psicológico tem a ver com os nossos problemas internos
      • Como as dúvidas quando tentamos uma grande mudança
      • Também pode ser externo → as pessoas próximas ao herói podem não gostar da mudança
  • A principal função do Guardião é testar o Herói
    • Ver como ele vai reagir diante de uma situação difícil 
      • E se é digno de seguir em frente
      • Muitas vezes o herói vence o Guardião "entrando em sua pele"
    • Heróis bem-sucedidos reconhecem no Guardião um aliado útil ou indicador da jornada
      • Em vez de atacar o Guardião, podem aprender a usá-lo
      • Heróis preferem transcender seus inimigos do que destruí-los
  • Aprender com os Guardiões é que garante a construção do herói
#Arauto
  • No primeiro ato geralmente há um desafio ao herói → os Arautos que trazem
    • Pode ser uma pessoa, condição, informação → mas isso desequilibra o herói e ele chega num point of no return, a partir dali tudo será diferente
      • Os arautos desempenham uma função importante ao anunciar a necessidade de mudança diante de algo novo
      • Desencadeiam a ação da história → por isso geralmente são usados no primeiro ato, embora possam aparecer em outros momentos da trama
    • Na maioria das vezes o Herói tem medo da mudança e reluta diante do desafio
  • O Arauto pode ser uma figura negativa, positiva ou neutra → e pode ser outro arquétipo
    • Muitas vezes o Mentor pode vestir a máscara do Arauto
#Camaleão
  • Esse é, de longe, o arquétipo mais difícil de definir porque a natureza dele é ser mutante
    • Os Camaleões podem mudar de aparência, estado de espírito e até lealdade → eles estão sempre em questão, são quase incógnitas
    • Podem ajudar o herói ou ser destrutivos
      • Mas em última instância o Camaleão sempre é um catalisador de mudanças
  • Sua principal função é trazer suspense à história
    • Os melhores exemplos são femmes fatales, embora o aspecto "fatal" não seja comum
      • O arquétipo serve mais pra confundir o herói
      • Muito comum na literatura noir
  • Como uma máscara, até o Herói pode vesti-la (pra passar por uma armadilha ou Guardião, por exemplo) → é o arquétipo mais fluído de todos
#Sombra
  • A ideia da Sombra é ser o "anti", o aspecto não-expresso, o rejeitado
    • São as coisas que não gostamos em nós mesmos e tentamos esconder de todos
    • Ela representa o poder dos sentimentos reprimidos → psicoses que levam à destruição
      • Nas histórias esse aspecto negativo se traduz principalmente em vilões
  • A principal função da Sombra é desafiar o Herói e apresentar um desafio à altura
    • São as Sombras que obrigam o Herói a crescer pra poder vencer
    • E também pode ser uma máscara
      • O Mentor pode usar isso em muitos casos
      • No caso da femme fatale → o caso romântico pode ter a máscara da Sombra
  • Importante que as Sombras não precisam ser totalmente malvadas
    • O ideal, na verdade, é que sejam humanizadas → tenha algum toque de bondade ou qualidade admirável com a qual se possa identificar
      • Podem ser humanizadas especialmente nos momentos de vulnerabilidade
      • Lembrando que muitas Sombras não se consideram vilões
  • Como os outros arquétipos, a Sombra não precisa ser uma pessoa
    • Pode ser uma luta interna do próprio Herói
#Pícaro
  • Esse é o arquétipo palhaço → é a força da mudança por meio do humor
    • São inimigos do status quo e trazem o Herói para a realidade 
      • Quando a história está ficando muito séria → o Pícaro tem importante função
      • É o chamado alívio cômico → não deixa a narrativa tão exaustiva
    • É possível haver Heróis picarescos
  • É comum que eles sejam personagens catalisadores → afetam os outros mas nem tanto a si
    • Em muitos casos gostam de causar confusão só pra se divertir

#Os arquétipos
Por fim, lembramos que os arquétipos são ferramentas extremamente flexíveis. Qualquer personagem pode assumir uma dessas máscaras em determinado momento da história. Por isso é importante conhecer cada um dos arquétipos, pra dar mais credibilidade psicológica ao comportamento dos personagens.

Seguimos depois (quando tiver mais tempo pra escrever) para os estágios da Jornada do Escritor, conforme Vogler propõe. O que ele vai fazer pelas próximas quase 200 páginas do livro, basicamente, é pegar todas as etapas da Jornada do Herói e aplicar ao processo criativo da escrita. É muito interessante sua abordagem e bem útil aos jovens escritores ao acaso.

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