sexta-feira, 9 de agosto de 2019

Resenha - Livrinho da Silva

PIMENTEL, Aldenor. Livrinho da Silva. Boa Vista: Catarse, 2017.


Considero o Aldenor Pimentel um dos principais escritores roraimenses contemporâneos. Vou falar um pouco mais dele no final, então, por enquanto, basta lembrar que foi este cidadão o "culpado" por eu ter ingressado no mundo da escrita literária. Foi num concurso organizado por ele em 2016 que eu me descobri um Escritor ao Acaso. Não por isso serei menos sincero nesta resenha. Perdoai-me, mestre. Seguimos a ela.

Livrinho da Silva é uma antologia de 24 contos recheando 72 páginas com histórias sobre livros e a literatura. A temática dos contos gira em torno do universo da própria escrita literária, do ato de escrever, do leitor, do livro ou, claro, do próprio escritor, não raro ambientadas em livrarias ou mundos em que a literatura causa impactos diferenciados. Vou iniciar da pior maneira, falando daquilo que não gostei tanto -- mas isso é só pra tirar logo do sistema, porque mais à frente tem coisa boa pra se falar.

Por mais que seja um livro de ficção, algumas vezes parece livro didático, cuja intenção é mais (in)formar do que transmitir uma ressonância literária per si (falo da "ressonância" tal como citada por King e Cassill). Tem uns diálogos que não soam nadinha verossímeis pra mim, mas este são principalmente estes contos que eu penso serem mais didáticos (como em "Da Luz").

Tem uns contos que, do meu ponto de vista, na verdade são crônicas do escritor. Algo interessante sobre estes: todos são tão bem escritos, que dá um pouco de frustração o fato do escritor não tê-los desenvolvido mais. Quando a gente está bem absorto e interessado no tema, puf!, já acabou o texto e a gente fica com aquele gostinho de quero mais (o que, deduzo eu, era justamente o objetivo do autor).

Por outro lado, em alguns momentos sinto falta de deixar espaço pro leitor descobrir as coisas. Talvez fosse interessante minimizar os adjetivos. Por exemplo, em vez de dizer "moleque arteiro", bastava dizer "moleque" e mostrar com as atitudes como ele era arteiro -- talvez sem nem mesmo dizer diretamente, mas usar a entonação (lembrando de Cassill) pra criar isso na mente do leitor. Em resumo, algumas vezes teve mais "tell" do que "show".

O conto "Olhar", penso eu, é o mais profundo em simbolismo e ressonância. Já o havia lido em outra ocasião (acho que foi até no blog do autor -- que, por sinal, encontra-se listado aqui à direita) e a premissa, bem como o desenvolvimento da história são muito bons. Eu imaginava que este aí seria o meu favorito, mas tive uma agradável surpresa: "Divino plágio" foi uma epítome de um bom conto, transmitindo o máximo, utilizando o mínimo. Poucos contos conseguem me fazer rir e me entusiasmar com tão pouco. Reli-o mais de uma vez, amando-o em todas.

E falando em contos curtos e eficazes, "Fantástico" deve entrar pra essa lista. Só o que me fez falta nele foi diálogo. Claro que também não sei as circunstâncias em que ele foi escrito (algumas vezes tento limites de caracteres em mente), mas visto que tanto King quanto Cassill elencam o diálogo como um dos pilares da escrita, apego-me a eles. Neste ponto eu me questiono se não estou ficando muito "manualista" nessas minhas leituras. Hum... A pensar.

Voltando a falar dos contos bons, cara, não tem como não falar de "Teu futuro te condena". Só de escrever na segunda pessoa do singular e narrada no futuro já é um feito tão singular e notável que o conto já teria mérito só disso. Mas esse conto vai além ao trazer um enredo muito bem escrito, força o leitor a (re)ler tudo com canto de olho. Acho isso fenomenal. A sacada do autor foi muito boa.

E, algo que não deveria ter me surpreendido tanto: o melhor conto ficou para o final. Interessante notar que tantas outras histórias vieram antes dele, mas nenhuma chegou perto da capacidade de expressar. Finalmente, neste, contemplei um pouco daquela matiz do escritor que a gente só conhece quando lê os textos dele. Enquanto revela muito do escritor, esta experiência serve para enriquecer o leitor. Um belo, belo conto.

Por fim, só quero destacar, mais uma vez, que o Aldenor é, hoje, um dos maiores "agitadores" culturais de Roraima. Promove concursos literários, palestras, vende livros, ajuda colegas a vender, corre atrás de patrocínio público e privado (o que não significa que ele consiga), enfim, "agita" a cena literária roraimense sem perder a pose.

Aliás, não sei como ele consegue escrever estes contos pequenos com tanta eficácia. Eu, no meu livro que é justamente de contos, não consigo escrever histórias menores do que o triplo do tamanho dos contos do Aldenor. E justamente pelo tamanho, estes contos são um gancho fatal: você termina o livro todinho no mesmo dia (que foi justamente o que aconteceu comigo).

É, meus caros, não tem jeito, ainda tenho um bom caminho a percorrer. Obrigado por me abrir as portas Aldenor e, agora, obrigado por me ajudar a caminhar. Continue a produzir a boa arte roraimense e a abrir portas para as novas gerações de escritores. Continue a agitar. 

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