terça-feira, 5 de março de 2019

Resenha - Everworld

APPLEGATE, K. A. Everworld: Search for Senna. New York: Scholastic Paperbacks, 1999.


Pense num(a) autor(a) que você leu quando criança ou adolescente e simplesmente amou os livros dele(a). Agora imagine que você está andando numa livraria nos Estados Unidos e encontra um livro dessa autora por $1,99. Eita! É o tipo da coisa que você tem que comprar, não é? Pois é, foi o que fiz. Apaixonado pela série Animorphs, de Applegate, quando vi o nome dela na estante, nem pensei duas vezes e comprei o livro. Deveria ter pensado duas vezes.

Everworld é um mundo que não deveria existir. É um "entre-mundos", como prefiro chamar. No pouco que o livro revela, quando ele foi criado os deuses do Mundo Antigo se mudaram para lá com seus povos. Então lá há Loki com vikings, mas também os deuses astecas, egípcios e também os misteriosos extraterrestres "Hetwan", que são os inimigos da parada. Vou resumir os fatos do livro porque imagino que ninguém vá ler isso, então vou spoilar quase tudo.

Um grupo de adolescentes no Ensino Médio (David, Jalil, April e Christopher) se encontram num lago, certa manhã, por motivos misteriosos, parecendo ter ouvido um chamado da menina Senna (meio namoradinha de David e irmã de April). Lá algo mucho loco acontece. A realidade se altera, a figura de um grande lobo carrega Senna e eles são puxados para o vórtex que alterou a realidade.

No outro mundo acordam acorrentados a um precipício e veem lá embaixo um barco viking deixando uma oferenda. De lá são retirados e levados ao palácio de Loki, onde ouvem menções a deuses astecas e a Amon-Rá. Loki, acompanhado de seu filho Fenrir (o lobão) então os interpela perguntando onde está "a bruxa", e, é claro, ninguém sabe; então Loki manda matar todo mundo. Mas eles escapam dos trolls e humanos os perseguindo. Fugindo pelo castelo quase são pegos por uma cobra gigante (filha de Loki).

Os aventureiros escapam do castelo de maneira misteriosa: caem em um fosso e não morrem (caindo devagar), no fundo encontrando um barco. Com isso eles saem do castelo mas logo são capturados por vikings que passavam por ali. Mentem dizendo que são menestréis (entertainers) para os vikings. São levados para a presença do rei, numa festa. No meio da festa um grupo de trolls entra dizendo que eles são fugitivos, mas o rei viking diz que não, protegendo os meninos. Depois eles descobrem que é jogada política porque o rei não gosta de Loki, porque ele exigiu dos vikings um pagamento para libertar Odin, a quem ele tinha aprisionado.

Há uma oscilação constante entre o mundo real e "Everworld", quando eles dormem em Everworld, acordam no mundo real. No mundo real eles descobrem que vivem suas vidas normalmente. Há uma duplicação da personalidade deles, de modo que a personalidade do mundo real sabe o que eles fizeram em Everworld e vice-versa, mesmo estando no outro mundo. É meio confuso mesmo.

Logo fica claro que essa oscilação vai ser central. No lado de Everworld, estão à caminho de uma batalha entre vikings e astecas; no lado normal, eles vivem suas vidas e tentam bolar uma maneira de não ficar nessa oscilação. Há um dilema no personagem principal, David Levin, sobre ficar ou voltar. Enquanto isso os vikings navegam até a cidade dos astecas, onde devem matar o deus asteca. Quando chegam lá, os meninos se envolvem na batalha. O livro termina com Huitzilopoctoli (o deus asteca) aparecendo de maneira colossal na batalha quando parece que os vikings estavam ganhando.

Termina aí porque é uma série e eu só fui saber disso quando peguei o livro pra ler, o que, aliás, aconteceu só agora em 2019, ou seja, 10 anos depois que eu comprei o livro e 20 anos depois que ele foi lançado pela primeira vez. Isso só prova que minha esposa estava absolutamente certa sobre comprar livros novos: "Vá primeiro ler os que tem na estante!". Mulher sábia.

muitos, muitos problemas no livro, do meu ponto de vista. Tem alguns clássicos como o menino pega espada primeira vez na vida e já saber usar, ou o fato de um grupo de alunos do ensino médio sabendo lidar com problemas de maneira coordenada. Mas esses são os menores deles. O Chamado à Aventura é fraco, ou pelo menos não foi bem construído: quem corre em direção ao perigo sem mais nem menos? Sem motivação? Quase não há justificativa para a travessia do limiar, foi bem forçado.

Falando em Travessia do Limiar, até que ela foi interessante, mas pouquíssimo crível. Sério, quando os meninos chegam do outro lado eles deveriam estar totalmente loucos. Em vez disso eles voltam totalmente lúcidos, capazes de absorver uma mudança drástica (alteração da realidade!) e lidar com os problemas de maneira coordenada! Cara! É muita falta de verossimilhança, a coisa não fica bem construída. Entenda que não satisfeita com alterar a realidade (incluindo algumas leis da física) a autora ainda os coloca num jogo de vai e volta com o mundo real e eles sendo capazes de administrar essa constante mudança! Eita bando de curumim superdotado, hein?

Aff, mas, agora, olhando para meus próprios comentários, talvez o livro seja só muito infanto-juvenil e eu esteja exagerando. Oh well. Também há algumas coisas boas no livro, que é a própria narrativa da autora. Achei muito interessante também ler algo que envolve os deuses nórdicos pré-cinema Marvel. Loki, Thor, Odin não são descritos como na Marvel e é legal ver outras construções.

Agora percebo uma coisa em Applegate que os olhos do escritor me mostram: ela sabe fazer marketing, ou, no mínimo, tem um excelente editor/agente. A começar pela própria estrutura interna do livro: capítulos curtos, quase sempre terminando em cliffhanger. Ou seja, o leitor sempre pensa: "Ah, é bem curtinho, posso ler mais um" e soma isso a "Eita! Ah, agora preciso ler pra saber o que vai acontecer". Esse tipo de sacada faz com que o leitor consiga pegar o livro e ler todo num dia só. Foi o que aconteceu comigo.

Eu já esperava algo assim, porque Animorphs todinho é desse mesmo jeito. Só que Animorphs é bem melhor escrito, os dilemas dos personagens são mais bem trabalhados e a situação, ainda que também extraordinária, é bem mais verossímil. Além dos capítulos curtos, o livro todo é curto. Há uma sacada aí do editor em usar uma letra grande e aproveitar os espaços. A pessoa termina o livro rápido e já dá vontade de começar o próximo. 

O problema é que, como demonstrei, não tem tanta coisa assim no livro pra começo de conversa, é mais uma jogada. Ao final, o livro ainda traz um pequeno trecho do próximo, atiçando ainda mais a curiosidade do leitor. Como em Animorphs, a autora divide a história ao longo de vários pequenos livros. Esta série tem 12 livros (não se assustem, Animorphs é dividido em 54 livros), cujo título é apontado na figura abaixo.


Bueno, como não poderia ser diferente, uma hora ou outra eu ia me deparar com algum título que não gostasse. Pena que foi um logo da Applegate. Aparentemente há uma certa fandom em torno da trilogia. Ela tem seus pontos fortes para um adolescente que esteja chegando no mundo da literatura, como um encorajamento à leitura. Mas, sinceramente, penso que há coisa melhor pra ler por aí. Estou doando a minha edição de Everworld: Search for Senna. Interessados, só entrar em contato.

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