terça-feira, 2 de agosto de 2022

Resenha – A vida, o universo e tudo mais

ADAMS, Douglas. A vida, o universo e tudo mais. São Paulo: Arqueiro, 2010.


Qual o limite do improvável? Quando uma série de acontecimentos tão, mas tão difíceis de acontecer deixa de ser um conjunto de improbabilidades e tornam-se uma impossibilidade? Esta foi apenas uma das muitas indagações que surgiram ao ler essa obra de absurda criatividade.

Depois de duas resenhas desta série de livros do Guia do Mochileiro das Galáxias (O guia do mochileiro das galáxias, e O restaurante do fim do universo), finalmente aprendi a ler Douglas Adams. O cara é tão absurdamente criativo, que não é palatável, não faz bem aos nervos ler mais do que quatro ou cinco páginas de uma vez, quiçá um capítulo, quando muito dois. Mais que isso o único resultado é a indigestão confusa de dois elevado à potência delta.

Foi assim que degustei essa obra. Quando minha mente não aguentava mais absorver tanta informação interessante e instigante (eita aliteração!), dei-a o benefício do descanso e revisitava o livro horas depois ou mesmo apenas no dia seguinte, quando meu cérebro teve a chance de processar (ou esquecer) as coisas que leu. Tem livros que a gente leva pra cabeceira da cama e lê um pouquinho antes de dormir. Não é esse caso. Se esse livro já é trabalhoso de ler acordado, imagine com sono.

Via de regra, sempre comento algo sobre a tradução quando esta me chama a atenção por algum motivo. Mas no caso deste livro (desta série na verdade), eu preciso citar por nome o tradutor Carlos Irineu da Costa, porque esse cara não está de pá, nem de para, ele está de PARABÉNS. Meu amigo, que sacadas geniais!

Não bastassem as traduções dos termos comuns, do estilo despojado do autor e sua sagacidade, Carlinhos ainda nos traz termos fenomenais como "Bistromática", a ciência de condução de naves espaciais por meio de robôs em um bistrô italiano; ou ainda o meu tão querido POP: "Problema de Outra Pessoa".
Um POP é alguma coisa que não podemos ver, ou não vemos, ou nosso cérebro não nos deixa ver porque pensamos que é um problema de outra pessoa. É isso que POP quer dizer: Problema de Outra Pessoa. O cérebro simplesmente o apaga, como um ponto cego. Se você olhar diretamente para ele, não verá nada, a menos que saiba exatamente o que é. A única chance é conseguir ver algo olhando de soslaio. (p. 23)
No caso do livro, o POP em questão era uma nave espacial pousada ao lado dum campo futebol lotado (críquete, pra ser mais exato, só usei o futebol pra ficar mais claro). Em outro momento do livro, coisas tão absurdas acontecem que até mesmo respirar se torna um Problema de Outra Pessoa. E este é apenas um exemplo das maluquices geniais que esse livro traz.

Não bastasse o POP, é neste livro que ele ensina a voar (muito simples, é só errar o chão), e também é aqui que Arthur Dent encontra-se com seu arqui-inimigo que ele nem sabia que tinha. Acontece que todas as vezes que aquele cara era trazido à existência (num esquema de constantes reencarnações), por algum motivo ele morria por causa de Arthur Dent. Num caso, ele era uma formiga que foi pisada por Arhtur; em outro ele era um coelho que foi atropelado pelo carro que Arthur dirigia; e naquela vez que Arthur se abaixou pra escapar de um tiro, em quem vocês acham que o tiro acertou?

É tanta coisa legal acontecendo ao mesmo tempo que a história principal, a vingança do mundo de Krikkit, acaba ficando em segundo plano. Nem por isso ela deixa de ser interessante e tampouco o livro perde sua capacidade de nos manter fixos em cada pequeno detalhe que acontece.
Há um momento em cada amanhecer no qual a luz parece flutuar e tudo parece mágico. A criação prende a respiração. (p. 38)
Como expliquei nas resenhas anteriores, seria necessária uma tese de doutorado pra abordar tudo que o livro tem. Infelizmente, mesmo tendo esta tese em mãos, a banca conseguiu cagar um argumento melhor. Desta vez, porém, consegui convencer os editores do Guia a me publicar no seu blog, com um artigo cujo título lia-se: "Mentecaptos do Universo, como eles não cansam de aparecer". Alguns dizem que foi uma crítica e que era pra eu me sentir ofendido. Na verdade, estou é lisonjeado.

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