quinta-feira, 7 de junho de 2018

Resenha - Biofobia

NAZARIAN, Santiago. Biofobia. Rio de Janeiro: Record, 2015. 115p. 


115 páginas. Cento e quinze. Pra quê? Biofobia, pra mim, olha... Não sei se é alguma coisa comigo que não entende os escritores ou se é algo neles mesmos. Biofobia não foi uma boa experiência e olha que eu fui sem expectativa alguma. Eu simplesmente resolvi ler o livro e dar uma chance para a literatura brasileira. 

Basicamente a trama é sobre um rockeiro quarentão que vai à casa da mãe após seu suicídio para fazer o funeral e dar as coisas dela. Ali na casa, ele se debate num dilema existencialista sobre a vida, sobre sua carreira artística (rockeiro em decadência), sobre sua vida romântica (nula), e por aí vai.  Pelo menos é isso que ele faz até a página 109 do livro. 

O problema é que o livro oscila entre várias possibilidades e não se fixa em nenhuma. Isso até poderia ser bom se tivesse sido construído para ter esse fim. Mas duvido muito que tenha sido essa a proposta. Em entrevista, o autor afirma que esse livro foi escrito para que ele pudesse se libertar da fama de escritor "juvenil" e tratar de um tema mais "adulto". 

Ele tenta fazer isso justamente pela abordagem existencialista do livro. Mas eis o que acontece: 1) Começo do livro: "Vou escrever uma abordagem existencial, algo profundo, explorar a psique do personagem, colocar suas relações em metáforas, abstrair seus pensamentos". E o autor foi fazendo isso até que: 2) A partir da página 109 (consciente ou inconscientemente): "Quer saber? Eu vou é escrever o que eu gosto mesmo e que se lasque".

Porque a partir da página 109 o livro claramente se torna um thriller, com toques de horror. O problema é que o autor não consegue se libertar plenamente nem de um nem de outro. No começo, ele flerta com esse tema, e joga cenas avulsas que não constroem nada. Na segunda parte (como estou classificando) ele vai abertamente para o horror e tenta mesclar o existencialismo, que acaba se tornando apenas lapsos de loucura, contribuindo ainda mais para o horror. 

Outro problema que achei é o uso aleatório de palavras complicadas. Assim, do nada. Parece que o autor folheou o dicionário e resolveu usar algumas palavras que estavam ali. Também sem mais nem menos o personagem principal resolve que é americanizado e solta uns "whatever", e outros termos pequenos em inglês. Aí eu pergunto: pra quê? 

Há algumas dificuldades de verossimilhança, pelo menos ao que me pareceu, na construção da irmã do cara principal. Por certo que problemas de verossimilhança num livro de horror e existencialismo desconexo são mitigados justamente por causa dessa temática, mas tem alguns que não dá pra esconder. A irmã do cara toma algumas atitudes e tem algumas falas que simplesmente não casam. 

Só um pequeno spoiler: no epílogo, a irmã volta com os filhos e o marido para a casa em que a mãe cometeu suicídio e o irmão desaparecera para ficar com a família durante as férias. Mas... porque ela faz isso?! A casa já ia ser vendida, fora toda depenada, ela mesma não fazia questão da casa (deu a entender isso em diversos momentos), e além do mais, pra quê trazer toda a família pra um lugar daqueles? É disso que tô falando, sabe? Parece aqueles filmes de terror que, mesmo sabendo que a casa era mal-assombrada-assassinato-morte-terror e tudo o mais, a família resolve simplesmente se mudar pra lá e habitar como se nada tivesse acontecido. Ah, fala sério!

Sinceramente, eu acho que teria sido uma melhor sacada literária se esse livro fosse na verdade separado em dois contos. A segunda parte, a do horror, está bem legal, de verdade! Ele poderia ter aproveitado bem melhor essa parte, dado a ela mais direção e transformado em conto. E aí ele pegava a primeira parte e dava ao personagem um olhar mais existencial. Teria sido uma sacada legal: de um lado o horror das ações e pensamentos do cara, de outro a sua (des)humanidade e dilemas.

Não sei dizer, ao final, se recomendo ou não a leitura. É difícil porque estou basicamente só expondo meu ponto de vista, não pretendo ser um crítico literário (teria que ter muito mais leitura e gabarito pra ser algo assim). A ideia desse blog, ao fim, é eu poder escrever tranquilo, então tinha que falar o que falei. Biofobia não foi legal, em vários momentos achei uma perda de tempo. Infelizmente não foi uma boa experiência com esse autor brasileiro. 

Mas volto ao que comecei: será que sou eu que não entendo os caras? Li algumas reviews falando bem e até falando que pensavam em transformar em filme ou teatro! Bom... talvez em forma de filme ficasse bom mesmo, porque aí eles necessariamente tirariam a gordura e deixariam só o filé: seria um excelente thriller. 

De qualquer forma. Biofobia. Não curti.

sábado, 2 de junho de 2018

Resenha - Solar

McEWAN, Ian. Solar. Tradução de Jorio Dauster. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. 304p.


Existe um velho ditado (e eu acredito nele) que diz: "Nunca julgue um livro pela capa". Ok. Mas em nenhum momento o ditado diz: "Não leia a descrição do livro antes de lê-lo". Pois é, foi o que fiz. Eu peguei esse livro, olhei bem a capa e pensei: "Mas uma ficção científica, oba!". Mas não era. Nem de perto. 

"Solar" trata da história de Michael Beard, um cientista ganhador do prêmio nobel, e sua caminhada rumo a uma grande descoberta. O problema é que nessa caminhada ele tem que lidar com seu problema de adultério, a infidelidade das esposas, seus ciúmes, obesidade, fraudes, violência, preguiça, e por aí vai.

Pois é, o livro se categorizaria pra mim como "drama", muito embora não pareça tampouco um drama. E aí que está a sacada de McEwan: está mais para uma sátira. Não há necessariamente partes emocionantes, e você não se apega tanto a determinado personagem excessivamente. Não obstante, o leitor não consegue vencer a curiosidade em saber o que vai acontecer com Beard e, em mais de um momento, arregalar os olhos com o que acabou de acontecer.

O livro é dividido em três partes: "2000", "2005" e "2009", referentes a anos importantes na vida de Beard. Na primeira parte somos apresentados à persona dele. Achei a construção psicológica do personagem construída por McEwan altamente invejável: ele consegue descrever sua criação sem cair naquela psicologia quase excessiva de Dostoiévsky (muitas vezes). 

Nesta primeira parte já somos apresentados à infidelidade de Beard no casamento e as consequências disso para sua vida conjugal: a esposa passa a adotar o mesmo procedimento. Além disso, o lado cientista de Beard mostra que depois que ele ganhou o prêmio nobel, nunca mais fez nada, contando apenas com seu prestígio para conseguir uma posição de destaque num laboratório na Inglaterra. Aliás, a história toda se passa lá.

Esta seção termina com a morte de um pós-doutorando que trabalhava sob os cuidados de Beard e que estava tendo um caso com a esposa dele. A morte de Thomas Aldous, foi presenciada apenas por Beard e foi totalmente acidental. Beard, porém, monta a cena para incriminar o amante de sua esposa. Por incrível que pareça, ninguém descobre. Nem no final do livro. Isso é bom, porque evita que o leitor preveja o fim da trama.

Nas outras partes "2005" e "2009", há um decrescendo na intensidade do livro. A primeira parte é bem mais exuberante e engaja mais o leitor em diferentes acontecimentos. Nas outras duas, vemos lentos desenvolvimentos da história ao passo que exploramos mais profundamente a psique preguiçosa de Beard e seus relacionamentos pós-divórcio cada vez mais complicados. 

No fim de "2005", uma de suas amantes fica grávida. Em "2009", vemos Beard e seu portentoso projeto de energia solar: uma solução ao problema do aquecimento global. Sublinhei o termo porque esse é o foco da pesquisa científica de Beard e em vários momentos o tema é trazido à tona com certa profundidade, até. Penso que essa reflexão de McEwan foi a grande sátira que propôs ao livro. Um meio-termo entre o discurso científico e as vozes dissonantes sobre o tema. 

Ao final, Beard é vencido pelo conjunto de acontecimentos que vinha tentando ignorar desde o começo. Sua amante e a mãe de sua filha se encontram, seu projeto de energia solar é desmascarado como sendo de outrem e ao final ele sente uma pontada no coração: amor por sua filha ou um ataque cardíaco fulminante?

O livro termina nesse exato ponto, deixando o leitor em suspenso. Creio que o autor acertou nesse ponto. O desenrolar dessa confluência de acontecimentos não é tão importante como o fato de que a confluência aconteceu deveras. O livro é bem interessante, embora não tenha nada a ver com ficção científica, como eu cegamente expectei. Ao fim, recomendo sua leitura e acho que valeu a pena investir em "Solar".