sábado, 7 de maio de 2022

Resenha – O restaurante do fim do universo

ADAMS, Douglas. O restaurante no fim do universo. São Paulo: Arqueiro, 2010. (O mochileiro das galáxias, v.2)


Este é o segundo volume da série "O Guia do Mochileiro das Galáxias" (primeiro volume resenhado aqui). Na época que li a série inteira pela primeira vez (creio que foi na minha adolescência, anos 2000) cometi um erro que, hoje, percebo que quase cometo outra vez: ler os livros um em seguida do outro.

Não funciona assim. Cada livro é muito denso, muito cheio de acontecimentos e significados. Seguir em frente sem absorver ou pelo menos digerir um pouco o que o outro livro passou é a receita para ficar cansado e não aproveitar bem a leitura. É preciso dar tempo, descansar.
"Existe uma teoria que diz que, se um dia alguém descobrir exatamente para que serve o Universo e por que ele está aqui, ele desaparecerá instantaneamente e será substituído por algo ainda mais estranho e inexplicável.
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Existe uma segunda teoria que diz que isso já aconteceu." (p. 5)
Como dá pra ver, o livro já começa com dois pé no peito. Não vou falar muito aqui da trama, uma vez que daria muito spoiler. Basta dizer que continuamos acompanhando a turma: Arthur, Ford, Zaphod, Trillian e Marvin. Dessa vez eles vão para no Restaurante no Fim do Universo e, no meio do caminho, tentar encontrar o homem que controla todo o universo (além de se perder no caminho e no tempo-espaço).

Este livro, pra mim, sofre com o que já acontecia um pouco no final do primeiro: o excesso. Embora, pra ser honesto, isto seja muito difícil de caracterizar, uma vez que é parte da própria forma de pensar e escrever de Douglas Adams – e o que o torna tão imortal e fantástico. Mas, pra mim, esse segundo volume do Guia é um bom exemplo de como criatividade demais pode ser complicado. Cada capítulo é tão intenso e recheado que, apesar de ele ter poucas páginas, não dá pra digerir direito.

Alguns podem argumentar que, portanto, esse não seria um livro pra ler rápido, mas sim um daqueles casos em que se deve degustar devagar (Charles Dickens, lembrei de você). Esse argumento até faz sentido, mas ele perde razão se considerarmos a proposta do próprio livro: ser rápido, despojado e irônico. Não dá pra cumprir isso com o tanto de informações que recebemos de uma vez só.
"— Olha, acabei de me materializar do meio do nada em um café — disse —, como resultado de uma discussão com um espectro do meu bisavô." (p. 32)
Mas vale dizer que não é sempre assim. No meio do livro, perto do Fim do Universo, o autor parece encontrar um meio termo adequado entre as maluquices e uma boa narrativa. Pelo que pude notar, isso foi possível por meio de frases curtas e bastante diálogo, conduzindo as cenas pra frente com agilidade (o que, em boa parte, é a proposta do livro sendo bem cumprida).

Quanto à narrativa, por um bom tempo, o protagonista se torna o Zaphod Beeblebrox, o que achei bem legal. Truby, em seu livro "A anatomia da história", ensina que o protagonista não é aquele que você escolheu, mas aquele personagem que tem a história mais interessante para ser contada. Muito natural e bem trabalhada essa mudança de foco para outro personagem. Tanto que de modo bem natural, perto do final, nos vemos fixos nas aventuras de Arthur e Ford, já até esquecendo um pouco de Zaphod.

É inegável a capacidade do autor de fazer a coisa ir pra frente quando não está tão imerso no seu absurdo de criatividade e maluquices. Ora, mas é isso que faz dele quem ele é, não? Bom, só sei que, talvez, o grande segredo seja não ler todos os livros em sequência. Dê tempo para sua mente tentar (tentar!) compreender tudo que leu.

Digo isso porque, eu mesmo, tenho certeza que ainda não consegui absorver tudo. Aliás, se você leu a última resenha, sabe que fiz até uma tese de doutorado sobre isso, tendo enfiado ela goela abaixo da banca. Porém devo dizer que, infelizmente, não fui aprovado. Mesmo depois de eu ter colocado sal na tese e feito eles comerem tudo, a banca cagou um argumento melhor.

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