quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Resenha - Lord of the Flies

GOLDING, William. Lord of the Flies. New York: Penguin Books, 1988.


Comprado por humildes três dólares, eu me vi novamente diante desse livro. Li-o a primeira vez lá pelos idos de 2008-2009 e, por algum motivo, minha mente havia apagado uma boa dose da história. Eita, que, conform eu reli o livro, descobri o motivo. Arre de livro doloroso.
"They were black and iridescente green and without number; and in front of Simon, the Lord of the Flies hung on his stick and grinned." (p. 128)
Lembrando que essa é a história de um grupo de garotos britânicos (tendo por destaque Ralph, Jack, Piggy e Simon) que, após um acidente de avião, no período da II Guerra Mundial, cai numa ilha deserta. Lá eles precisam achar um jeito de se organizarem para sobreviver à ilha. O que eles descobrem, porém, é que o pior não são as intempéries ou quaisquer perigos que a ilha possa oferecer. O maior problema é quem chegou na ilha: eles mesmos.

Essa não vai ser uma resenha longa, até porque já tem muita coisa escrita sobre esse livro (e muito melhor do que eu tenha a dizer, com certeza). Então vou me limitar a uns dois ou três comentários, mergulhar no que considero ser o âmago do livro, e concluir. 

Pra começar, às vezes eu acho que é melhor o silêncio do que falar besteira. Sei que é muita audácia falar isso de um Nobel de literatura. Mas essa descrição aqui poderia ter sido omitida sem prejuízo nenhum do texto: "Somehow, they moved up." (p. 23). Ah, mano. Assim até eu.

O autor tem a capacidade incrível de nos fazer mergulhar na história. A gente sente a tensão no ar, cada pequeno acontecimento ou fala contribuir pra construção do clima e as reviravoltas (que pareceriam bestas se vistas isoladamente) são o cimento que une tudo de maneira fantástica. 
"In his other life Maurice had received chastisement for filling a younger eye with sand. Now, though there was no parent to let fall a baby hand, Maurice still felt the unease of wrongdoing." (p. 55)
Sobre tantos assuntos que podem ser discutidos, a essência do livro está aqui. E a essência do livro se chama pecado. Aliás, o próprio autor chamou esse livro de um "estudo sobre o pecado". Há uma forte carga de conteúdo teológico aqui e isso é inegável (a começar pelo título).

Longe da autoridade, os meninos podiam dar vazão à maldade dentro deles, vivendo num estado de natureza anárquico que logo se degenerou para a lei do mais forte (nosso velho e conhecido estado de natureza hobbesiano – e já que estamos nesse tópico, o autor ataca sem medo o estado de natureza rousseauniano)

Neste trecho específico, vemos os últimos momentos antes do começo da queda. Os meninos, deixados à sua própria natureza, mergulham cada vez mais no que há de mais inerente ao ser humano: o mal. E quando vemos isso, há um paralelo magnífico para fazer com a própria Escritura Sagrada:
"Quando, pois, os gentios, que não têm a lei, fazem, por natureza, o que a lei ordena, eles se tornam lei para si mesmos, embora não tenham a lei. Estes mostram a obra da lei gravada no seu coração, o que é confirmado pela consciência deles e pelos seus pensamentos conflitantes, que às vezes os acusam e às vezes os defendem," (Rm. 2:14-15)
A verdade, meu povo, é que há leis gravadas na própria essência do ser humano. Em qual sociedade é preciso ensinar a criança a fazer o que é errado? E quando ela erra, é preciso ensinar-lhe a mentir para encobrir o erro? Se não há verdades e leis que são naturais a todas as sociedades, em qual delas o ato de matar por matar é visto como aceitável? Qual delas subsiste na sua essência sem noções de justiça, família, direito, e tantas outras coisas que a mente limitada do homem ocidental insiste etnocentricamente em defender como criações suas?

É por isso, minha gente, que o texto bíblico é tão enfático em dizer que as pessoas são indesculpáveis . Conquanto a consciência humana e a natureza não revelem as verdades específicas sobre Deus, elas inequivocamente apontam para Ele. A partir daí, basta a pessoa buscar alguém que possa explicar ou falar das verdades especificas. E uma coisa digo ainda: quem quer que esteja lendo este texto não poderá dizer que faltou oportunidade.
"Porque os atributos invisíveis de Deus, isto é, o seu eterno poder e a sua divindade, claramente se reconhecem, desde a criação do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que Deus fez. Por isso, os seres humanos são indesculpáveis." (Rm. 1:20)
O livro é muito intenso. Não foi à toa que minha memória bloqueou boa parte das sensações que o livro evoca. A constante e crescente decaída rumo à selvageria é assustadora... porque ela é verossímil. Mesmo agora eu percebo que minha mente se nega a lembrar de muitos detalhes. E isso porque eu acabei de terminar. 

Gente, não é à toa que um livro ganha Nobel de Literatura. Essa obra é incrível do começo ao fim. Veja quanta coisa tem pra dizer – e isso porque eu abordei só um detalhe. Essa é uma leitura que todo mundo deveria fazer em algum momento da vida. Por minha conta, pode ler o Senhor das moscas.

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