segunda-feira, 10 de novembro de 2025

Resenha — Alice no País das Maravilhas

CARROLL, Lewis. Alice no País das Maravilhas. Arara Azul. Ebook. 2002.


Resolvi retornar aos clássicos e ler essa obra que é tão conhecida. Eu só não esperava descobrir que esse livro é uma absoluta loucura! Acho que nunca tinha lido um livro tão nonsense na minha vida — e olha que já li e sou fã de Guia do Mochileiro das Galáxias. À resenha.

A história já é bem conhecida. Trata-se de uma garotinha inglesa que, num dia a passear no campo com sua irmã, vê um estranho Coelho Branco correndo e entrando numa toca. Ela o segue e se vê num lugar totalmente misterioso, onde as leis da física não fazem sentido, e onde as pessoas fazem menos sentido ainda. Lá ela encontra o Gato, a Lagarta, o Chapeleiro Maluco, o Rei e a Rainha de Copas, a Falsa Tartaruga, o Grifo, Bill (o Lagarto) e vários outros personagens doidos.

Acho que nunca vi um texto que representasse tão bem o ponto de vista de uma criança. Embora tenha chamado isso de nonsense (o que, de fato é), talvez pudesse chamar de fantasia pura, onde as coisas não fazem sentido mas seguem uma estranha lógica interna, coisa que só criança tem.

Só pra dar um exemplo: em uma cena, Alice entra numa casa onde encontra a Duquesa. Esta tem um bebê nos seus braços, enquanto sua cozinheira está virando o zezeu na cozinha pra dar conta de tudo. Alice vê aquela bagunça e contempla a Duquesa cantando uma música para o bebê no braço. Mas então a Duquesa se cansa e arremessa o bebê no colo de Alice, se retirando da cena. Quando ela se retira, a cozinheira joga uma frigideira com óleo fervente na direção dela, mas erra. Alice então segura o bebê, mas percebe que ele virou um porco. Então ela solta o porco na floresta. 

O livro é cheio de loucura. Não tem outra explicação. Tudo é muito absurdo e maluco, as coisas que parecem fazer sentido, simplesmente não fazem. E isso fica ainda mais claro nos diálogos, que são um primor! O diálogo com o Chapeleiro Maluco é interessante, mas nem se compara aos diálogos com a Lagarta e o Gato. 
Ela esticou-se na ponta dos dedos e olho sobre a margem do cogumelo, seus olhos imediatamente avistaram uma enorme lagarta azul, sentada no topo da planta, com os braços cruzados calmamente fumando um narguilé, não dando bola nem para ela nem para mais nada. (p. 40)
É inevitável que façamos comparações com o filme da Disney que carrega o mesmo nome. Enquanto o filme omite algumas partes, é ao mesmo tempo surpreendentemente fiel. Na verdade, fiquei surpreso que a Disney conseguiu fazer um filme razoavelmente coerente a partir desse livro! A história é loucura total! Realmente o autor conta as coisas do ponto de vista de uma criança de um modo que não tinha visto ainda.

Já perto do fim do livro, Alice presencia um julgamento em que o Valete é acusado pela Rainha de Copas e o Rei preside o tribunal. O júri está todo reunido, e começam a chamar as testemunhas. Alice sugere que se chame a Duquesa, porém ela estava presa. Alice ficou curiosa para saber o que havia acontecido. O Coelho Branco explicou:
"Ela deu um murro nos ouvidos da Rainha...", o Coelho começou a contar. Alice disparou -a rir. "Oh, psiu!", o Coelho murmurou em um tom assustado. [...]" (p. 78-79)
De pontos negativos, ressalto que o livro tem muita música no meio (pequenas poesias infantis). Me pergunto se isso era característica de livro da época, porque lembro de ter visto isso na Sociedade do Anel e detestei (Tom Bombadil chato pra caramba), assim como detestei agora porque quebra todo o ritmo da narrativa. Tudo bem, entendo que é de outra época e escrito pra leitores de outro contexto — mas ainda assim me incomoda.

Além disso, é interessante ver como muitos dos personagens são orgulhosos. Estão sempre prontos a mostrar como são inteligentes ou espertos e como os outros são burros ou merecedores de chacota. Acho preocupante isso, mas entendo que é da natureza humana. Crianças também podem ser egoístas e más.

Enfim, o livro é sensacional. Adorei a leitura e valeu a pena. Como disse, parece que estava lendo um Guia do Mochileiro das Galáxias, mas do século XIX. Aliás, as aventuras de Alice conseguem ser ainda mais nonsense do que as de Arthur Dent. Acho que quem melhor resumiu tudo foi o Gato, e finalizo com as palavras dele:
"Mas eu não quero ficar entre gente maluca", Alice retrucou.
"Oh, você não tem saída", disse o Gato, "nós somos todos malucos aqui. Eu sou louco. Você é louca." (p. 59-60)

0 comentários:

Postar um comentário