segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Resenha — A camareira

PROSE, Nita. A camareira. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2022.


Comprei esse livro porque de repente me vi sem nada pra ler. Encontrava-me num estranho interregno em que não queria ler nada grande demais, nem algo pequeno demais. Uma leitura básica qualquer seria perfeita. E foi navegando na Amazon que encontrei esse livro por um preço razoável. Então vamos à resenha.

A camareira, como o nome sugere, conta a história de uma camareira de um grande e luxuoso hotel. Esta personagem, que tem mania de limpeza e dificuldade no traço social (parece uma forma de autismo, inclusive), certo dia encontra um grande empresário morto no seu quarto de hotel. Então ela se vê no meio de uma trama que envolve negócios escusos, gente perigosa, e suspeitas que recaem sobre ela.

Tratei o livro, a princípio, como uma mera leitura de entretenimento, aqueles livros básicos que se tornam bestsellers só porque usam todos os clichês. E, honestamente, o livro meio que é isso mesmo. Mas não posso negar que encontrei, algumas reflexões sutis e profundas em alguns momentos — ainda que não seja nada que saia demais do lugar-comum.
[...] a sujeira tem mania de se esconder embaixo das coisas, de se enfiar nos espaços. (p. 68)
O gênero do livro me parece meio confuso. Começamos acompanhando a história da camareira, do seu trabalho, seus medos e esperanças. Me pareceu que seria um drama contemporâneo. Mas das duas uma: ou a autora se perdeu, ou ela resolveu capturar o público usando de alguns clichês do gênero heist pra intensificar a trama. Honestamente não creio que isso é um problema tão grande assim, mas meio que rompe o contrato com o leitor e a gente se sente meio tapeado.

A tradução também me pareceu questionável em alguns momentos. Não li o original em inglês, mas em alguns momentos a leitura me pareceu pouco fluída ou entroncada mesmo. Ora a tradutora é bem informal, ora encontramos "ela retorquiu". Dá pra ler bem, é até tranquilo, mas volta e meia a gente dá uma pausa e tem que reler pra ver se entendeu mesmo, o que prejudica o fluxo da leitura.

Sobre os personagens e a trama em si, não achei nada do outro mundo. É bom o suficiente pra captar a nossa atenção, segue aquela regra básica de livros de entretenimento, os arcos são bem claros. Não sei até que ponto houve de fato consistência com a personagem principal, que oscilava entre alguns extremos que não faziam sentido com o que fora apresentado até então.

No fim das contas, é um livro médio, básico, mas que cumpre o seu papel. Diria que o livro, em sua totalidade, é honesto com o leitor ao proporcionar entretenimento e nos fazer mergulhar o suficiente na história para querer saber o que vai acontecer. 

É um livro que vai mudar a vida de alguém? Provavelmente não. Mas pra quem quer passar o tempo com uma leitura de boas, vale a pena. 

terça-feira, 5 de novembro de 2024

Crônicas que eu não deveria publicar — 3

Algumas coisas me dão pena. Conquanto eu entenda que o princípio da autodeterminação dos povos é essencial para uma vida em sociedade, isso não diminui em mim o sentimento de pena por ver pessoas vivendo uma vida que, a meu ver, é tão penosa.

Lembro da primeira vez que, depois de passar meses em Brasília por conta de uma viagem a serviço, voltei para Boa Vista. Era um voo da madrugada e foi um baque quando saí do aeroporto e recebi aquela lufada de vento quente de 30ºC às 2 da manhã. Tomei um susto ao perceber que aquela era a realidade da cidade, do povo que vive ali. Meu primeiro pensamento foi: "Meu Deus... como é que tem gente que se submete a isso?"

Sentimento parecido tenho agora que passei dois dias em Manaus. Me dá muita pena ver um povo que se acostumou à bagunça e à sujeira. Até mesmo nos lugares mais arrumados fica bem clara a falta de atenção com os detalhes, a falta de esmero e cuidado. É que eles já não enxergam mais.

É um povo que se acostumou ao caos do trânsito, por exemplo. Ser civil no trânsito é motivo para irritação dos motoristas. O certo é você tomar proveito, passar na frente, fechar o outro carro, dificultar para o pedestre. Os outros que esperem, nunca eu.

No começo me deu raiva, mas agora me dá pena. Porque a impressão que tenho é essa, que o povo se acostumou e já nem enxerga mais. A má vontade em ser atendido é outro ponto que ressalta isso. Já se acostumaram, não fazem nem questão de tentar fazer melhor. E os clientes já se acostumaram a brigar e reclamar. Já é parte da cultura local.

Minha mãe ama Manaus. Foi a cidade em que ela nasceu e cresceu, é um lugar cheio de nostalgia. Não importa quantos fatos nós apresentemos a ela, simplesmente prefere ignorar e se apegar às memórias e impressões que tem do passado. No passado isso me irritava, hoje me dá pena. 

Minha mãe tem todo o direito de gostar desse lugar. Gostar de verdade, sabe? Tem todo direito de ignorar a realidade e ser feliz com as boas coisas que ela encontra. Mas me dá pena. Porque no fundo, eu estou vendo ela viver uma vida penosa, dura. Ela enfrenta as dificuldades da cidade, e enfrenta bem, isso é louvável. Mas me dá pena saber que, ao fazer isso, ela está se gastando, se consumindo, e isso diminui o tempo que eu vou ter com ela.

Me dá pena em saber que, mesmo tendo a opção de ir para o que é bom, ela também já se acostumou com isso. E não só se acostumou, como até prefere. É triste, é triste. Mas é o que temos. 

Espero que eu também não me acostume com as coisas ruins, mas que sempre busque o que é melhor. É claro que não sei o que é melhor, acho que ninguém de fato sabe. Só não quero correr o risco de me acostumar com o que é ruim. Deus, me ajuda.