Eu quero muito, muito dar uma chance à literatura brasileira contemporânea; mas ela não colabora. É triste dizer isso, ainda mais porque creio que esse livro tinha muito potencial. Bom, vamos à resenha.
O livro traz a história de dois personagens: Joseilton, um pobre esquizofrênico que mora na pobreza de São Paulo, e Brian Lyndon Johnson, um jovem britânico, rico e bipolar. A narrativa trata dos dois separadamente e elas se tocam brevemente no final.
Aqui já começo a falar o que o livro tem de bom: o começo me fascinou muito. O jeito que o autor narra a vida de Joseilton é muito bom. Acho que é simplesmente porque o autor me parece honesto. Soa como se, ao contar uma história, ele simplesmente contasse uma história. Ainda se percebe um pouco de firula, mas dá pra relevar. Rapidamente eu já estava envolvido, não nego — até porque sou muito fã de drama urbano.
Aliás, de modo geral, a capacidade de narração do autor é invejável. Cobre um tempo grande com poucas palavras e sem perder o leitor. Tem algo muito humano no que o autor traz. A lenta transição da doença de Joseilton é muito bem montada, tem um toque de frescor. Algumas circunstâncias são meio caricatas. Novamente, não é bem polido, mas é bom.
Porém, o que o livro tem de bom acaba aí. No começo, achei que o personagem principal sofre do problema de ser muito passivo. O autor é tão suave com ele que o rapaz parece não ter traços firmes de personalidade. Algumas mudanças bruscas de comportamento, por exemplo, sem nenhum setup prévio, tornam o personagem menos crível. Mas isso era apenas a ponta do iceberg.
Enquanto o autor é ótimo em narração, é triste ler seus diálogos. Mas assim, triste mesmo. Mesmo. De dar raiva e pena ao mesmo tempo. Não parece duas pessoas conversando, mas dois bonecos sem vida humana. Se isso já era evidente na narrativa mal polida, nos diálogos é que se escancarou de vez.
O autor testa a nossa paciência desnecessariamente. Enquanto na narrativa inicial temos algo de visceral e humano, na parte em que o personagem Brian é o principal, tudo soa artificial. Os personagens parecem os mesmos, são superficiais, a narrativa ainda é razoável, mas é o tipo de coisa que não compensa.
Não bastasse a artificialidade dos personagens, o autor ainda consegue piorar a situação inserindo vários diálogos que não levam a absolutamente lugar nenhum. Os personagens do nada começam a discutir temas profundos, o que deixa evidente que o autor só queria filosofar e encontrar uma plateia pra seu blablablá. O autor usa isso como um recurso narrativo barato e é de tão mau gosto que salta aos olhos do leitor.
Ainda no quesito personagens, parece que o autor só sabe escrever dois tipos de personagem: o indignado e o manda-chuva. O indignado se exaspera com tudo, fala palavrão, é um descontrolado que quer ter razão. O manda-chuva, por outro lado, é o que sempre fala calmo, que está por cima da carne seca. Todos, TODOS os personagens do livro preenchem esses dois papeis uma hora ou outra.
Os personagens não são personagens, são marionetes que se encaixam nesses papeis. Não têm personalidade, não tem vontade, não dá vontade de ler. Na verdade, o autor, sem saber, se descreveu na seguinte citação:
[...] as suas letras denotam sentimentos forçados e desejos afetados, sem qualquer naturalidade e conexão com o público em geral. (p. 101)
Sabe, é triste. De verdade, dá pena. No começo do livro o autor traz uma abordagem única e fascinante: um personagem principal esquizofrênico. Aí quando retornamos a esse personagem esse traço é simplesmente ignorado (*emoji de palhaço*). Pior: até agora estou tentando descobrir qual foi o propósito narrativo em inserir um segundo personagem principal da Inglaterra numa história que já estava tão boa com um personagem brasileiro.
De novo, não posso negar que o autor tem estamina. O cara tem fôlego pra escrever. Honestamente, é de impressionar que a pessoa aguente escrever 312 páginas disso e lidar com esses personagens por tanto tempo. Enfim. Foi bom enquanto durou, pena que durou pouco. Do meio do livro pro fim, o autor me fez (novamente) desgostar da literatura contemporânea.
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